sábado, 21 de janeiro de 2017

O céu é o limite

Dentre os diversas frases feitas sobre o vinho, marcam particularmente as que aludem aos deuses, paraíso, Baco ou seu “primo” Dionísio, e que mais não são que tentativas de dizer o inexprimível. Se cada vinho é uma viagem, é verdade que há vinhos que abrem as portas do céu. Literalmente.

A tradição religiosa liga o vinho nos diversos credos à redenção, transformação e purificação. A água que contém foi a salvação no tempo da peste e os poderes para os antigos eram tais que induziam alegria no coração dos homens. A verdade é que a relação da vinha com o agricultor é assumidamente misteriosa, pelo que mediação com o divino surge mais como corolário que como dogma. De certa forma, o impulso empreendedor presente nas catedrais góticas está também presente nos grandes lugares de vinha. Ao homem cabe a integração plena e a fusão com tudo o que se passa na vinha. Neste início de ano que todos pretendemos e desejamos cheio de boas concretizações, alinhámos os vinhos de um micro terroir da mágica aldeia de Provesende, onde Cláudia Cudell e Jorge Tenreiro criaram junto ao céu um lugar especial, assumindo-se como verdadeiros vignerons. A Quinta do Cume é de ano para ano o reforço de um compromisso com a terra e céu, de que os vinhos equilibrados e elegantes são testemunho. E no Alentejo fomos dar com os títulos Cartuxa e Scala Coeli - escadas do céu -, que é o nome do convento dos frades da rigorosa regra de S. Bruno junto a Évora e que continua a atrair vocações. A Fundação Eugénio de Almeida gere todo um património que passa pela mão enológica de Pedro Baptista e sua equipa, se já é regalo suficiente provar os seus vinhos, mais se entende numa visita o que verdadeiramente acontece ali. Estrutura grande, instalação vanguardista e preparada para os volumes que é preciso produzir, mas a atitude é sempre a mesma, seja na pequena vinha duriense de Provesende ou na extensão alentejana de Évora: instalar o céu.

(Evasões de 17.01.20)


Vinhos de céu

Oficiam Jean-Hughes Gros na Quinta do Cume e Pedro Baptista na Adega da Cartuxa, como intérpretes de dois terroirs onde as pequenas revoluções e inovações vão acontecendo naturalmente. Vinhos por isso a acompanhar nas sucessivas edições. Boas provas!

17,5 - Quinta do Cume Reserva DOC Douro branco 2015 | Quinta do Cume - 13 euros
Desde a primeira edição que os brancos desta casa são especiais, aliando a sedução dos frutados a uma mineralidade forte que fica na memória. Este pode bem ser o melhor até agora.

16,5 - Quinta do Cume Selection DOC Douro tinto 2013 | Quinta do Cume - 8 euros
Integração e equilíbrio, numa proposta que privilegia mais a estrutura do que os frutados primários, criando um ambiente geral agradável e particularmente apto à mesa.

17,5 - Quinta do Cume Reserva DOC Douro tinto 2013 | Quinta do Cume - 16 euros
Expressão directa da riqueza e exotismo da vinha donde provém, estrutura firme e fina na qual cai uma acidez bem trabalhada. Sente-se-lhe a força, goza-se a grande frescura na prova.

17 - Cartuxa regional alentejano branco 2015 | Fundação Eugénio de Almeida - 9,5 euros
Vem da mesma casa que produz o já mítico Pêra Manca, e há que conferir a qualidade deste branco amigo da mesa nesta edição. Muito bom equilíbrio em boca, resolve bem peixe grelhado, arrozes e açordas.

17,5 - Cartuxa Reserva regional alentejano tinto 2013 | Fundação Eugénio de Almeida - 26 euros
Vinho de grande talante, preparado para as empreitadas proporcionadas pela cozinha alentejana dos assados e da caça, óptimo para os pratos de tacho da tradição portuguesa.

17 - Scala Coeli Viosinho regional alentejano branco 2014 | Fundação Eugénio de Almeida - 22,5 euros
A adopção e adaptação perfeita de uma casta eminentemente duriense, a permitir que nasça um título vínico que se espera ver repetido em novas edições. Um verdadeiro prazer, vinho bem feito.

18 - Scala Coeli Touriga Nacional e Touriga Franca regional alentejano tinto 2013 | Fundação Eugénio de Almeida - 34,5 euros
O triunfo da ousadia, suportada por uma enologia de primeira linha. Faz jus ao nome e representa o espírito inquieto e criador que deve estar presente quando se trata de vinho. Brilhante,

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